Realizou-se no passado sábado em Lisboa um debate promovido pela Associação de Amizade Portugal-Cuba onde participaram mais de uma centena de pessoas, além de conhecidos e conhecedores oradores, entre os quais o embaixador de Cuba em Portugal. À excepção do Avante! nem um único órgão de comunicação marcou ali presença. Estávamos nós em pleno gozo do nosso direito à indignação face a mais este boicote mediático quando, na passada segunda-feira, nos deparámos com várias notícias sobre Cuba, todas com o mesmo título: «Damas de Branco impedidas de protestar em Havana».
Ou seja, aqueles que ocultaram um debate com mais de uma centena de pessoas e com o representante do Estado cubano em Portugal, são os mesmo que optam por dar eco a uma «notícia» que nos «informa» de uma «manifestação» de seis – sim Seis! – mulheres cubanas. Mas se isto bastaria para provar que não estamos perante uma notícia mas sim uma campanha difamatória, a leitura das notícias clarifica ainda mais o seu carácter manipulador e enganoso. Em primeiro lugar porque afinal as «Damas de Branco» se manifestaram – as próprias afirmam que «aguentámos 7 horas» e as fotos das agências internacionais que lá estiveram a cobrir livremente o «evento» comprovam-no. Em segundo lugar porque o tal impedimento – que o não foi – foi nem mais nem menos que uma manifestação de cerca de uma centena de cidadãos cubanos – tão cidadãos como as tais seis senhoras – que expressaram exactamente da mesma forma, ou seja na rua, o seu desacordo com as razões da dita «manifestação». Rapidamente foram transformados pela imprensa em «apoiantes castristas» e em «agentes de segurança do regime».
Do que as notícias não falam é do real objectivo da encenação destas seis senhoras e das agências de desinformação internacionais: esconder que no passado domingo, num país onde o voto é facultativo, 8 205 994 cubanos (94,69% dos eleitores) foram às urnas escolher os 12 mil 986 delegados às assembleias municipais do poder popular; que num país onde o voto é secreto, 91% dos votos recolhidos foram considerados válidos; que o Partido Comunista não concorre às eleições e que é o povo que escolhe os candidatos em assembleias de bairro e que nessa «terrível ditadura» terá que haver uma segunda volta na próxima semana em vários círculos porque, pasme-se, os eleitores optaram por não dar a alguns candidatos a maioria dos votos.
(sublinhados meus)
In jornal «Avante!» - Edição de 29 de Abril de 2010
Bem, se o PCP tivesse dito a frase do título seria logo insultado... Mas não, não foi o PCP.
O PCP disse isto, por exemplo:
«Os primeiros seis meses de vida do Governo do PS confirmaram não apenas a persistência nas mesmas opções e orientações políticas comprometidas com o interesse do grande capital e que tem conduzido ao agravamento dos problemas do país, como a intenção de prosseguir de forma agravada como o evidenciam o Orçamento de Estado para 2010 e a apresentação e discussão do Programa de Estabilidade e Crescimento.»
«O Governo PS e o capital tentam apresentar como inevitável uma política que, ditada pela alienação de sectores estratégicos, pela mercantilização de serviços públicos essenciais à vida das populações e pela liquidação da capacidade produtiva, se traduzirá no final de 2013 numa situação económica e social ainda pior.»
Ouviram? Mário Soares disse: «Houve um momento em que os próprios Partidos Socialistas foram um pouco colonizados (e digo isto entre aspas: "colonizados") pelo neoliberalismo americanono tempo do Bush».
Mas este gigante da política nacional, Mário Soares, já tinha afirmado coisa parecida em 6 de Setembro de 2009:
«Acho que começa a haver uma reacção muito positiva mesmo dentro dos partidos socialistas europeus que forammuito colonizadospelo neoliberalismo.»
Para começar, foram muito colonizados ou foram um pouco colonizados? Ó Dr. Mário Soares, decida-se, não nos deixe nesta angústia! E como é que é ser colonizado-com-aspas?
Depois, Mário Soares afirma que foi «no tempo do Bush». No tempo do Bush-pai, do Bush-filho, do Bush-Clinton ou do Bush-Obama? Ou de todos os Bushes anteriores?
Ora vamos lá a ver qual era o Bush que colonizava (com aspas ou sem aspas?) o PS no tempo em que Mário Soares visitava Carlucci no «ninho do corvo» (lembra-se, Dr. Soares?). Era Gerald Ford, aquele presidente que nem sequer tinha sido eleito, visto ter substituido Spiro Agnew e, depois, Richard Nixon.
E agora, com Obama? Não foi já este Governo do PS que mandou tropas de combate para o Afeganistão?
Vamos lá perguntar a opinião ao «amigo» de Mário Soares, Manuel Alegre:
«Esperava-se então que fosse a hora do socialismo democrático. Mas o que veio foi a globalização neoliberal. Com os socialistas na defensiva ou ideologicamente colonizados.»
Está ver, Dr. Soares? Afinal o seu «familiar» está praticamente de acordo consigo! O meu palpite é que vocês andam zangados porque ambos querem mostrar que «restauram» melhor a aparência do PS!
E o que diz Mário Soares de Manuel Alegre, na citada entrevista à Antena 1? Ouçamos:
«[Manuel Alegre] esteve durante muito tempo, enquanto deputado (...) a condenar e a criticar de uma maneira dura e de uma maneira, às vezes, difícil o Partido Socialista».
Mas, ó Dr. Mário Soares, o senhor faz uma crítica, que se pode dizer implacável!, ao PS (que «foi colonizado pelo neoliberalismo americano») e depois vem censurar o Manuel Alegre?
Bem, como diz Aguiar Branco citando Lénin: O que é que se há-de fazer? [Isto não vem a propósito mas fica sempre bem uma citação]