A Soberania Alimentar
A realidade impõe cada vez mais a defesa a produção nacional e a garantia da soberania alimentar. Foi esta a conclusão da «Conversa da Treta» da edição de 30 de Maio. Mas como?
Com uma outra política para a agricultura nacional. Política que realize uma profunda avaliação da situação agrícola. Que promova uma ruptura com a actual Política Agrícola Comum (PAC) e com as imposições da União Europeia (U.E.) para a agricultura.
No imediato, em primeiro lugar, é essencial tomar medidas que tenham como objectivos garantir a soberania alimentar com o direito a produzir. Bem como a definição de uma nova política agrícola e alimentar nacional, de acordo com as potencialidades agrológicas e as necessidades do País.
Em segundo lugar, é indispensável assegurar a elevação dos rendimentos dos agricultores. O que passa pela defesa do emprego e melhores salários dos trabalhadores agrícolas. E pela preservação do tecido social agrícola, assente numa forte rede de explorações agrícolas familiares.
Depois, é necessário assegurar a coesão económica e social, travando o agravamento das assimetrias regionais, a desertificação e perda de actividade agrícola de muitas áreas agro-rurais.
Finalmente, é necessário proporcionar a segurança alimentar com uma produção agrícola e pecuária (e processos de conservação e transformação) que assegure produtos de qualidade.
Nada disto foi tido em conta na recente proposta legislativa da Comissão Europeia (CE) sobre o "Estado de Saúde" da PAC. Proposta essa que revela uma total insensibilidade social e maltrata a agricultura familiar, os pequenos agricultores.
Face à escalada no aumento dos preços que se tem verificado nos últimos meses, ao abandono da terra e ao desaparecimento de muitos milhares de explorações agrícolas a CE, em vez de inverter o caminho perseguido pelas últimas reformas da PAC, antes o acentua.
É particularmente grave que, no actual contexto, se proceda à supressão total dos pagamentos associados à produção ainda existentes (com excepção apenas das vacas em aleitamento, dos caprinos e ovinos), transferindo-os para o regime de pagamento único.
Isto ao mesmo tempo que avança no desmantelamento progressivo de organizações comuns de mercado importantes como do vinho, do açúcar, das frutas e hortaliças, do tabaco, da banana. Bem como o desmantelamento do sistema de quotas leiteiras até 2015, a supressão da intervenção (trigo duro, arroz e a carne de suíno), fomentando ainda mais o abandono da terra e da actividade agrícola.
De igual forma, mantém o incentivo ao absentismo e a distribuição injusta dos subsídios entre produtores, produtos e países. Acelerando assim o processo de concentração da produção em alguns países e regiões. Acelerando a especulação sobre o mercado das terras agrícolas e a actividade especulativa sobre os géneros alimentícios. Acelerando a formação de cartéis pelas indústrias alimentares e de distribuição. Acelerando a promoção do modelo da «agricultura intensiva» e «competitiva», com consequências negativas para a soberania e segurança alimentares.
Esta proposta da Comissão não tem em conta, e era necessário ter, que a agricultura e os sistemas de produção agrícola são muito diversificados no conjunto dos países da União Europeia.
É necessário uma outra política agrícola que tenha como princípio o direito à soberania e segurança alimentares de cada país e a resolução dos estrangulamentos que têm levado ao abandono da produção pelos pequenos e médios agricultores.
In "Jornal do Centro" - Edição de 27 de Junho de 2008