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O CASTENDO

TERRAS DE PENALVA ONDE «A LIBERDADE É A COMPREENSÃO DA NECESSIDADE»

O CASTENDO

TERRAS DE PENALVA ONDE «A LIBERDADE É A COMPREENSÃO DA NECESSIDADE»

A evolução política e o regime democrático (I)

    2.3.1. A evolução da situação política nacional desde o XVII Congresso foi marcada pela formação de um Governo PS, suportado numa maioria absoluta na Assembleia da República; pela eleição de Cavaco Silva nas eleições presidenciais, assegurando pela primeira vez a vitória do candidato da direita nas eleições para aquele órgão de soberania; pela intensificação da ofensiva contra direitos e conquistas sociais prosseguida pelo Governo presidido por José Sócrates; e por desenvolvimentos na continuada postura de envolvimento e de submissão de Portugal a interesses e estratégias externos, de que a Presidência Portuguesa da União Europeia e o Tratado de Lisboa são elucidativo testemunho. Uma evolução que torna mais exigente e complexa a luta por uma ruptura democrática e de esquerda com a política de direita.

2.3.2. A acção do Governo, na sequência da obtenção pelo PS de uma maioria absoluta nas eleições legislativas de 2005, veio confirmar não apenas a previsível intenção do PS em dar continuidade aos eixos essenciais da política de direita prosseguida pelo PSD, como as condições que essa maioria lhe facultaria para a sua intensificação.

2.3.3. A eleição de Cavaco Silva animou, como o PCP previra, os projectos de liquidação de direitos e de apagamento de importante conquistas da Abril por parte dos sectores mais reaccionários e revanchistas da direita e do grande capital, e o seu desejo de voragem dos recursos e da riqueza nacional.

2.3.3.1. Constituiu-se também como um factor de incentivo, que este ou aquele veto não desmentem, às opções e orientações essenciais de acentuação das políticas de direita assumidas pelo actual Governo PS. A designação dos membros para o Conselho de Estado; o apoio explícito às políticas do Governo na área económica; o apoio ao processo de integração na União Europeia e ao abandono pelo Estado das suas obrigações constitucionalmente consagradas; o acordo com as alterações que têm vindo a verificar-se no plano das relações laborais; o envio de forças militares portuguesas ao serviço do imperialismo; a negação do direito do povo português de se pronunciar sobre o novo tratado da UE, são alguns dos posicionamentos que confirmaram, ao longo dos primeiros dois anos do seu mandato, a articulação entre a acção do Governo PS e os interesses da direita que o actual PR representa.

    2.3.4. O actual Governo PS, presidido por José Sócrates, prossegue uma ofensiva global visando a reconfiguração do papel do Estado e a privatização das suas funções através de um intenso caudal de políticas anti-sociais e anti-populares que, em total submissão face aos interesses do capital nacional e internacional, e beneficiando do inteiro estímulo por parte do Presidente da República, se confirma como elemento central da ofensiva mais geral que visa a liquidação das principais conquistas e direitos alcançados com a Revolução de Abril, e que a Constituição consagra.

2.3.4.1. A crescente subordinação do poder político ao poder económico do grande capital nacional e transnacional é uma das marcas mais negativas da evolução política dos últimos quatro anos em Portugal. Uma subordinação que se concretiza, também, através de mecanismos e instâncias «informais» – Opus Dei, Fundações, ordens maçónicas e diversas organizações supranacionais como o Grupo Bilderberg, ou os encontros de Davos – que gozam de enormes privilégios e poder e que decidem, sem qualquer legitimidade ou controlo democráticos, políticas estratégicas, partilhando meios e orçamentos geridos pelo Estado. Subordinação do poder político ao poder económico bem expressa, nestes últimos anos, nas iniciativas do chamado «Compromisso Portugal», quer pelo que representou de definição dos novos objectivos do grande capital, quer pelas indisfarçáveis ligações e apoios que os seus promotores e as suas novas reivindicações revelaram ter no PS, PSD e CDS-PP e nos principais órgãos de soberania.

2.3.5. A crescente limitação das liberdades e o progressivo empobrecimento da democracia, consequência directa e inevitável da ofensiva económica e social, constituem, pela sua expressão agravada, um facto novo e inquietante.

2.3.6. As sucessivas revisões da Constituição da República e a sua violação sistemática, por omissão ou acção, têm constituído parte integrante da ofensiva contra o regime democrático. A possibilidade aberta por uma revisão ordinária em 2009 animou, nos sectores mais vinculados com o processo de restauração monopolista e de desfiguramento do regime democrático, expectativas quanto a alterações que conduzam a uma total subversão do texto constitucional. A declarada formulação por parte dos representantes do grande capital das suas pretensões em matéria de revisão constitucional, que anseia constitucionalizar o que é inconstitucional, traduzindo um novo passo na arrogante intromissão do poder económico sobre o poder político que a acção do Governo e as declarações de importantes dirigentes do PSD animam, é um sinal claro dos objectivos e perigos em presença.

2.3.6.1. No quadro de uma política sistematicamente desconforme ao texto constitucional, o propósito inscrito pela direita de uma nova ofensiva contra a Constituição confirma que esta, apesar das mutilações a que foi sujeita, não apenas continua a ser um obstáculo a projectos mais avançados do grande capital, como mantém no seu texto princípios e disposições susceptíveis de constituir orientação para políticas económicas e sociais alternativas às que têm conduzido ao agravamento dos problemas do País. A luta contra os projectos que visam novas e mais profundas mutilações à Constituição, e ao que esta preserva enquanto valor intrínseco ao próprio regime democrático em matéria de garantia de direitos e de princípios económicos e sociais progressistas, é parte integrante da luta contra a política de direita e por uma política alternativa.

2.3.7. Como instrumento ao serviço do branqueamento das responsabilidades da política de direita e dos partidos que a aplicam, a recorrente ideia sobre a chamada reforma do sistema político, sempre concebida na perspectiva de um empobrecimento democrático, tem nos projectos de revisão das leis eleitorais – no sentido do favorecimento da bipolarização e da diminuição da pluralidade – um elemento central da sua concretização.

2.3.8. A evolução da situação política e as crescentes dificuldades que PS e PSD possam vir a sentir para manter a base de apoio política necessária ao prosseguimento das políticas de direita constituem, por si, um factor adicional para procurarem na alteração dos sistemas eleitorais – quer para as autarquias, com a eliminação da eleição directa das Câmaras e a transformação artificial de maiorias relativas em absolutas, quer para a Assembleia da República, com a criação dos círculos uninominais e uma eventual redução do número de deputados –, o que mais dificilmente obterão pelo voto.

    2.3.9. São parte integrante da ofensiva contra a democracia política as limitações às liberdades e às garantias dos cidadãos, o reforço do aparelho repressivo, o ataque ao poder local democrático, a ostensiva partidarização das instituições e a sua colocação ao serviço dos projectos do partido do poder, o controlo e centralização das políticas públicas regionais e locais, a legislação sobre os Partidos Políticos e o seu respectivo financiamento.

2.3.9.1. As limitações a direitos e garantias fundamentais – impedimento da liberdade sindical e de associação, limitações ao direito à greve e crescente coacção sobre o direito de expressão e de manifestação, cerceamento do direito à propaganda – que acompanham a intensificação da ofensiva económica e social, convivem com crescente recrudescimento das ideias e da actividade de organizações fascistas.

2.3.9.2. O reforço dos aparelhos e medidas especiais de repressão – concentração de polícias e serviços de informações, alargamento de ficheiros em bases de dados, conservação de registos de chamadas telefónicas, generalização de videovigilância ou escutas sem controlo judicial.

2.3.9.3. O ataque dirigido contra o poder local e a sua autonomia conheceu com o Governo PS novos e mais graves desenvolvimentos que abrangeu quase todas as áreas de actuação, alterando substancialmente o seu quadro de actuação, de que se destaca: aprovação de um novo regime financeiro que, para além da redução da capacidade financeira, repõe um regime de consignação de verbas e de tutela de mérito sobre a gestão dos recursos financeiros; instituição de mecanismos de controlo e tutela administrativa para lá dos limites constitucionalmente previstos; imposição de medidas limitadoras da cooperação intermunicipal contrárias ao princípio de livre associação, como é o caso do novo regime de associativismo municipal e da extinção das regiões de turismo enquanto entidades com emanação autárquica e com autonomia .

2.3.9.4. A partidarização do aparelho do Estado, alimentada por uma densa teia de quadros que ocupam, designadamente por nomeação, lugares estratégicos da Administração e do aparelho do Estado, ou que beneficiam da concessão de áreas e funções nos serviços públicos, tem por base decisões ditadas não por razões de interesse público mas sim de favorecimento de posições e influência do PS.

2.3.9.5. A opção por uma política centralista, em que se insere a opção pela não regionalização, a redefinição de estruturas do Estado e o direccionamento de investimentos à medida de interesses partidários, e em particular o modelo de gestão do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN), tem em vista favorecer o controlo de políticas e decisões, marginalizar as autarquias e os agentes económicos locais, alargar a teia clientelar e o tráfico de influências sob comando do Governo e da suas estruturas desconcentradas. 

2.3.9.6. As Leis dos Partidos Políticos e do seu Financiamento confirmam-se como peças centrais na progressiva limitação de liberdades e de empobrecimento democrático. A par da intolerável ingerência e limitação, confirmada pela recusa das alterações propostas pelo PCP, à soberania de decisão sobre as formas de funcionamento e organização dos partidos – que tem em vista procurar impor ao PCP o modelo dominante no PS, PSD e CDS-PP –, assiste-se à crescente intervenção que, a propósito da fiscalização da contas, visa não a sua compreensível verificação, mas sim, através de uma acção assente no arbítrio e abuso de poder, objectivos persecutórios contra o PCP, e em particular contra a Festa do Avante!, a mais importante iniciativa política e cultural do País.

2.3.10. No plano das autonomias regionais, não obstante o desenvolvimento constitucional e legislativo aprovado nos últimos anos (clarificação e desenvolvimento no texto constitucional das competências regionais, a revisão do Estatuto Político-Administrativo dos Açores ou o Estatuto dos Representantes da República), verificou-se, designadamente ao nível do regime financeiro, um condicionamento acrescido. A Lei de Finanças Regionais aprovada pela maioria parlamentar do PS, assente em critérios não objectivos e determinado pela obsessão do défice e por uma deliberada discriminação entre as regiões autónomas, está longe de se constituir como o elemento necessário à construção de um regime financeiro adequado ao aprofundamento da Autonomia. 

     2.3.11. O regime democrático saído da Revolução de Abril, correspondendo a uma nova realidade na sociedade portuguesa consagrada na Constituição da República, tem tido nos detentores do poder e na política de direita o seu principal inimigo e agressor. A evolução da vida política nacional fica marcada pelo permanente conflito de mais de três décadas entre a acção e os objectivos prosseguidos pelos sucessivos governos do PS e PSD, com ou sem o CDS-PP, e o carácter progressista e avançado do regime democrático, e da activa intervenção do poder dominante para o procurar amputar, limitar e liquidar.

2.3.11.1. Resultado de um longo processo de descaracterização, suportado em sucessivas revisões constitucionais e sobretudo na produção de legislação ordinária (muita dela contrariando o texto constitucional), o regime democrático, num Portugal cada vez menos soberano, apresenta-se politicamente empobrecido e desfigurado, amputado da sua dimensão social e económica originária e crescentemente asfixiado pelos interesses do grande capital.

2.3.11.2. A vida política e democrática apresenta-se hoje crescentemente reduzida à dimensão formal das democracias burguesas actuais, comuns à generalidade dos países capitalistas, e bem distante do regime democrático que a Revolução originou e a Constituição de 1976 consagrou.

2.3.11.3. Embora, e sublinhando esse valor distintivo não subestimável, o regime constitucional mantenha no seu texto fundamental princípios e disposições susceptíveis de ser invocados em defesa de direitos fundamentais, de opções de desenvolvimento económico compatíveis com os interesses do País, da soberania e da independência nacionais, o que constitui uma arma na luta contra a política de direita e por uma política alternativa.

2.3.12. O processo de desfiguramento da concepção do Estado, tal qual a Constituição o consagra, e do consequente empobrecimento do regime democrático que a política de direita de sucessivos governos prosseguiu, conheceu com o actual Governo um novo impulso. São traços desse processo:

2.3.12.1. O incremento da subordinação do poder político ao económico, dando continuidade a um processo em que o Estado é reflexo do poder económico e, simultaneamente, agente activo na prossecução dos interesses desse poder.

2.3.12.2. A reconfiguração do aparelho administrativo orientado para a acelerada redução de funções e responsabilidades sociais do Estado e para a sua redução a funções de soberania, de justiça e repressivas.

2.3.12.3. A destruição do vínculo público de emprego na linha de uma concepção de alienação de políticas públicas.

2.3.12.4. A limitação, condicionamento e controlo do poder judicial, comprometendo a independência dos tribunais e o princípio constitucional da separação de poderes.

2.3.12.5. O desenvolvimento de um novo conceito (e uma nova lei) de segurança interna com o reforço de orientações e missões de carácter securitário e repressivo.

2.3.12.6. A progressiva «europeização», fusão, governamentalização e opacidade dos serviços de informações.

2.3.12.7. O reforço das orientações centralizadoras e um ataque à autonomia administrativa e financeira das Regiões Autónomas e do poder local, procurando também condicionar a sua autonomia política.

2.3.12.8. A progressiva alienação de soberania em matéria de política externa, de defesa ou orçamental ditadas pelo processo de integração capitalista da União Europeia, assim como pela participação na NATO, e por Tratados e acordos lesivos do País.

    2.3.13. A defesa e concretização dos direitos políticos, económicos, sociais e culturais são inseparáveis de uma alteração em sentido democrático do Estado e das suas funções. Uma alteração que assegure a assunção pelo Estado das funções sociais que lhe cabem, que modernize e desburocratize a administração pública, que combata o tráfico de influências e o comando pelo poder económico das políticas nacionais, que reforce as Autonomias e o poder local e concretize a regionalização, que efective os direitos de participação dos trabalhadores e das populações. A construção de um Estado democrático constitui simultaneamente um objectivo programático autónomo e uma condição de realização de outros objectivos.

2.3.14. O sentido geral da política de direita, que o actual Governo acentuou exponencialmente, em matéria de Administração Pública e dos trabalhadores ao seu serviço, é o da liquidação ou redução dos serviços que deveriam garantir os direitos económicos sociais e culturais, de privatização dos serviços rentáveis, de degradação dos direitos e carreiras dos seus trabalhadores.

                                      

In Projecto de Teses do XVIII Congresso do PCP

                      

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