O espectro continua a andar por aí
«Como anotavam as primeiras palavras do Manifesto, "andava pela Europa o espectro do comunismo". Ao longo do século e meio decorrido, continuou a "andar", agora pelo mundo, o mesmo espectro, a que as forças do capital chamaram "o perigo comunista". E, ao findar o século XX, ao mesmo tempo que proclamam que "o comunismo morreu", as campanhas violentas, constantes, universais, que lançam contra ele, mostram que não morreu mas está vivo e para viver.»
Esta frase foi escrita por Álvaro Cunhal, em 1 de Fevereiro de 1998, nas páginas deste jornal. Pelos vistos o «espectro» continua a andar por aí. Talvez seja oportuno recordar aqui e agora alguns factos históricos.
O fenómeno do nazi-fascismo foi, antes de mais, um acontecimento social e político relacionado com a crise profunda das sociedades que ele serviu. Na atmosfera político-social da Europa Ocidental (e não só) dos anos vinte e trinta do século XX, tornou-se possível a conquista do Poder em vários países pelos fascistas. O capital financeiro e industrial aspirava a colocar no primeiro plano um sistema que o ajudasse a unir e subjugar as grandes massas de cidadãos. Se possível a estupidificá-las e fanatizá-las.
É sabido que as ideologias racistas satisfazem sempre uma determinada «encomenda» social. É igualmente verdadeiro que quando o grande capital necessita de uma determinada política, sempre aparece um político que corresponde às exigências do momento.
Nos anos 20 e 30 do século passado a encomenda social da reacção era clara: criação duma organização de massas que pudesse combater a sempre crescente influência das ideias do socialismo. O anti-sovietismo e o anticomunismo, a luta contra a intelectualidade de esquerda e dum modo geral contra as camadas progressistas da sociedade, eram a senha das facções mais reaccionárias das sociedades capitalistas de então.
No início da década de trinta surgiu a nada santíssima trindade nacional-socialismo-militarismo-imperialismo, de que falava o principal acusador americano em Nuremberga, o general Taylor.
O resultado é conhecido. Ascensão ao poder numa série de países dos nazi-fascistas, defensores de uma sociedade de exploração, de superioridade racial, de extermínio físico de povos e raças inteiros, de repressão e opressão. A política da «solução final» não abrangeu apenas os judeus. Alargou-se aos ciganos e aos eslavos. Em apenas 3 anos (1941-43) 1/3 da população masculina da Bielo-Rússia foi aniquilada.
Sejam quais forem as tentativas de negar e subverter a verdade, a vitória sobre o nazi-fascismo ficará para sempre gravada na História como um feito para o qual o povo soviético e os comunistas na Europa e em todo o mundo deram a mais heróica e decisiva contribuição.
Foram os comunistas que tiveram o triste privilégio de inaugurar os campos de concentração hitlerianos e de neles serem literalmente quase exterminados. Aí morreram mais de 4 milhões de cidadãos soviéticos. Nos países ocupados pela Alemanha e pelo Japão desempenharam um papel essencial, muitas vezes decisivo, na condução da Resistência. De 1940 a 1944, setenta e cinco mil comunistas franceses morreram torturados, fuzilados ou em luta directa com o ocupante. A história repetiu-se em Itália, na Checoslováquia, na Polónia, na Albânia, na Jugoslávia (um milhão de mortos), na Hungria, na Bulgária, nas repúblicas Bálticas. Na China, no Vietname, nas Filipinas, etc., etc., etc.
A Alemanha perdeu na sua guerra contra a URSS o correspondente a ¾ das suas baixas totais. Na frente soviética o exército japonês perdeu cerca de 677 000 homens (na sua maioria prisioneiros). Morreram, recorde-se, em todos os cenários da II Guerra, 250 000 norte americanos, 600 000 ingleses, 25 milhões de soviéticos (três milhões dos quais membros do Partido Comunista).
Não fosse o sangue derramado pelos comunistas e seus aliados na luta pela liberdade e pela democracia e o mundo tal como o conhecemos não existiria. Pensem nisto.
Especialista em Sistemas de Comunicação e Informação
In jornal "Público" - Edição de 24 de Julho de 2009