Isto não é um Concurso de Beleza
Parece mas não é. Dir-se-ia que alguns jornalistas, comentadores e analistas andam a esforçar as meninges à procura de transmitir a mensagem de «mudança». Tudo (ou quase), dizem e escrevem, no XVIII Governo Constitucional é novo.
Mais ministros técnicos e menos políticos, dizem uns. Um parêntesis: alguém me explica o que é um «ministro técnico» ou «cheio de qualidades técnicas»? Há algum ministro de um governo, em qualquer país do mundo, que não seja político?
Mais mulheres escrevem outros, referindo a presença de 5 caras femininas no elenco ministerial. Há mesmo quem vá mais longe e fale no governo constitucional mais à esquerda (???). A cereja no bolo parece ser a inclusão na pasta do Trabalho de uma mulher ainda por cima sindicalista (UGT).
José Sócrates não fica atrás e no seu discurso de tomada de posse falou em «contexto de mudanças» (como não podia deixar de ser…). E definiu as suas prioridades: «(…) combate à crise, modernização, justiça social.».
Estamos no reino do faz de conta. A forma, a aparência, prevalece sobre os conteúdos concretos. Assistimos a um claro processo de manipulação, porque quem assim fala e escreve sabe perfeitamente que a realidade é outra.
A questão não é de rostos mais ou menos bonitos, de sexo masculino ou feminino, de mais tecnocrata e menos político ou vice-versa. O cerne da questão são as políticas reais e concretas que o governo vai levar à prática.
Desde logo uma questão essencial: quem vai pagar a crise? Quem lucra com ela, ou os mesmos do costume? É sabido que Portugal enfrenta uma grave situação económica e social. Que caminhos vão ser seguidos para a superar? Vão prosseguir as políticas que conduziram o país a um inquietante declínio económico e a um insustentável aumento das desigualdades e injustiças sociais?
Os desenvolvimentos mais recentes são inquietantes e não auguram nada de bom. Há sectores políticos e económicos que parecem sentir-se com novo ânimo e alento. Referimo-nos aos sectores mais retrógrados do grande patronato. Os exemplos, infelizmente, não faltam.
Do questionamento do acordo sobre o Salário Mínimo Nacional, às arrogantes declarações do presidente do BPI a propósito das margens de negócio da banca. Do anúncio dos despedimentos na Delphi e Quimonda, ao recurso a novos Lay-off. Da eminência da destruição da produção nacional de vidro plano na Covina/Saint Gobain, ao agravamento da situação de milhares de outros trabalhadores.
Também em muitas empresas do distrito de Viseu se vive uma preocupante situação social. Continuam os Lay-off, a retirada de direitos, a redução de salários, a crescente precarização dos vínculos laborais. No sector agrícola os agricultores vêm diminuir drasticamente os seus rendimentos por falta de escoamento dos produtos (vinho, maçã, azeite, gado, leite, etc.).
A realidade do país aí está a confirmar a urgência de uma nova política de ruptura e mudança. Capaz de abrir um outro rumo assente num desenvolvimento económico e sustentado do país, no combate às injustiças e na afirmação dos direitos e conquistas sociais.
Especialista em Sistemas de Comunicação e Informação
In "Jornal do Centro" - Edição de 30 de Outubro de 2009