Que «indisponibilidade» para governar?
A questão é recorrente. Sempre que a luta aquece, como gostam de dizer os dirigentes do Partido Socialista, vai-se ao baú das velharias e lá vem a falácia: «os comunistas não estão disponíveis para governar connosco.» Acrescenta-se num tom choradinho, qual Calimeros: «se estivessem…». E o cenário fica composto. É assim há mais de 33 anos, de Soares a Sócrates com passagem por Guterres.
Só que a realidade tem sido outra bem diferente e entra pelos olhos dentro: a permanente indisponibilidade do PS em abandonar as políticas resultantes da aliança entre a direita dos interesses e os interesses da direita.
Um exemplo claro, clarinho, para todos entendermos. Ao contrário do que diz o PS (e o PSD), há uma outra via alternativa para aumentar as receitas do Estado em época de crise e de contracção económica.
É por aqui que o PCP quer ir. Propondo que os rendimentos que nunca pagam impostos os passem a pagar. Propondo que os mais ricos e poderosos, a banca e os grandes grupos económicos, tenham menos benefícios e paguem mais do muito pouco que hoje pagam.
Por isso o PCP propôs em Junho na Assembleia da República a criação, entre outros, de um novo imposto sobre transacções e transferências financeiras. Este imposto iria, nomeadamente, taxar em 20%, as transferências financeiras efectuadas para os paraísos fiscais (offshore).
Entre 2005 e 2009, durante os dois governos de José Sócrates, mais de 78 000 milhões de euros foram transferidos de Portugal para os offshore. Em 2009, não obstante a crise, foram mais de 11 000 milhões de euros. E, em 2010, só nos primeiros três meses, já saíram mais de 2 200 milhões de euros para paraísos fiscais. Tudo capitais e rendimentos que não pagam um único cêntimo sequer de imposto!
Com a taxa que o PCP propunha que fosse aplicada a estas transferências seria possível arrecadar mais de 2 200 milhões de euros de receita fiscal adicional, só no ano de 2009. Quase o triplo (!!!) do que o Governo e o PSD esperam obter com o aumento do IRS e com o aumento geral das taxas do IVA (cerca de 830 milhões de euros).
O que fez o PS? Recusou liminarmente esta (e todas as outras) proposta do PCP. Optou, mais uma vez, por aumentar a carga fiscal sobre os trabalhadores e o povo que trabalha. Aumentou de forma acentuada os escalões mais baixos do IRS. Subiu as taxas do IVA.
Pergunta-se: de que lado está o Partido Socialista? Quem está indisponível para o quê?
Especialista em Sistemas de Comunicação e Informação
In "Jornal do Centro" - Edição de 23 de Julho de 2010
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