Miguel Torga: NÃO PASSARÃO
Não desesperes, Mãe!
O último triunfo é interdito
Aos heróis que o não são.
Lembra-te do teu grito:
Não passarão!
Não passarão!
Só mesmo se parasse o coração
Que te bate no peito.
Só mesmo se pudesse haver sentido
Entre o sangue vertido
E o sonho desfeito.
Só mesmo se a raiz bebesse em lodo
De traição e de crime.
Só mesmo se não fosse o mundo todo
Que na tua tragédia se redime.
Não passarão!
Arde a seara, mas dum simples grão
Nasce o trigal de novo.
Morrem filhos e filhas da nação,
Não morre um povo!
Não passarão!
Seja qual for a fúria da agressão,
As forças que te querem jugular
Não poderão passar
Sobre a dor infinita desse não
Que a terra inteira ouviu
E repetiu:
Não passarão!
"A onda de tirania submergia os cinco continentes.” “O fascismo em Espanha completava o cerco à liberdade” e “o grito simbólico duma causa”, emitido pela Passionária (Dolores Ibarruri) em Madrid cercada pelos nacionalistas, estivera até na origem das “estrofes candentes” do poema “Não Passarão” que o autor veio a reunir com outros, em 1952, sob o título Alguns Poemas Ibéricos (refundidos e acrescentados, mais duma década depois, como Poemas Ibéricos).
“Português hispânico”, respirando o “ar peninsular”, Torga atravessou a Espanha franquista em armas e pôde “presenciar, ao vivo, alguns dos horrores” do “fratricídio intolerante” da Guerra Civil, tomar conhecimento, in loco, do cortejo de desgraças perpretadas contra os republicanos por caudilhos nacionalistas, com “esquadrões marroquinos, batalhões nazis e divisões fascistas”, deplorando que o mesmo fascismo totalitário se tivesse instalado em Portugal sem a “força afirmativa do povo espanhol”: Morrem filhos e filhas da Nação, / Não morre um Povo.”
In Miguel Torga 1907 - 1995 :: A Voz do Chão :: Adolfo Rocha
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adaptado de um e-mail enviado pelo Jorge