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O CASTENDO

TERRAS DE PENALVA ONDE «A LIBERDADE É A COMPREENSÃO DA NECESSIDADE»

O CASTENDO

TERRAS DE PENALVA ONDE «A LIBERDADE É A COMPREENSÃO DA NECESSIDADE»

23 de Janeiro de 1898 – Nasce Sergei Eisenstein

Sergei Eisenstein

Revolucionário, professor, escritor, cineasta, encenador, realizador, Sergei Mikhailovich Eisenstein é um dos maiores e mais inovadores cineastas de todos os tempos e o cineasta por excelência da revolução soviética.

Nascido em Riga, na Letónia, Eisenstein (1898-1948) desenvolveu novas técnicas na forma de filmagem que mantêm toda a actualidade e são motivo de estudo em todo o mundo.

No seu primeiro filme, «A Greve», sobre a revolução fracassada de 1905, a última sequência é inesquecível: mostra em paralelo um massacre de bovinos e o de trabalhadores pela polícia.

Segue-se o «Couraçado Potemkin», um estrondoso sucesso internacional que permanece um clássico do cinema.

Após um breve interregno nos EUA, onde roda «Que viva o México!», Eisenstein regressa à URSS e realiza mais duas obras-primas: Alexander Nevsky e Ivan o Terrível.

Este último, uma trilogia inacabada devido à súbita morte de Eisenstein, de ataque cardíaco, é um verdadeiro hino à nação russa.

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13 de Janeiro de 1898 – Émile Zola publica «J'Accuse»

J accuse

A carta com o título «J'Accuse», em que o escritor francês Émile Zola acusa o governo de francês de encobrir a verdade no caso Dreyfus – um escândalo político que dividiu a França no final do século XIX –, fez a manchete do diário L'Aurore, que esgota em poucas horas os 300 000 exemplares da sua edição.

«O meu dever é falar, não quero ser cúmplice. As minhas noites seriam atormentadas pelo espectro do inocente que paga, na mais horrível das torturas, por um crime que não cometeu» – escreveu Zola, denunciando a situação do capitão Alfred Dreyfus, de origem judaica, acusado num processo fraudulento, conduzido à porta fechada, de espionagem a favor da Alemanha, condenado e deportado para a Guiana Francesa.

Zola, apoiado por vários intelectuais, entre os quais Anatole France, Georges Courteline, Octave Mirbeau ou Claude Monet, lutará até à sua morte pela reabilitação de Alfred Dreyfus, o que vem a suceder anos mais tarde.

 

Émile Zola

 

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Crónicas do País da fome, do medo e da ignorância

Retalhos da vida de um médico

 

Em Retalhos da Vida de Um Médico, percorremos os itinerários do país salazarento, interior, doente, matreiro e desconfiado, país das homílias da conformação, das leiras da fome, das casas celtiberas, da insalubridade quase medieval, da rudeza elementar e da transcendência. O jovem médico, acantonado em Monsanto, nessa que foi, no desvario folclórico do fascismo, a aldeia mais portuguesa de Portugal, percorre veredas, socalcos, caminhos abertos nas faldas da serra por onde as mulas, os burros e os carros de bois se esgueiram entre ventos e chuva, para socorrer os pacientes que o procuram quase sempre em situação extrema, quando desenganados de charlatães, bruxedos e mezinheiros, muitas vezes para apenas confirmar o óbito. Um povo triste e desamado.

(...)

Retalhos da Vida de Um Médico é um exemplo do texto clássico do neo-realismo e uma das obras fundamentais da literatura portuguesa do século XX. Um documento raro, sensível e lúcido sobre a realidade profunda do Portugal fascista; país de silêncios, de medos e de revoltas crescendo no meio dos trigais que Namora, sem contemplações, põe a nu – país de ocultas misérias denunciado pela pena de um autor que nestes textos se revela indignado com o sofrimento dos seus concidadãos, e é esse modo de dizer a revolta, de a tornar humana e lídima, que torna estes textos actuais e de uma indefectível universalidade.

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A confiança dos que lutam

A Paixão de Sacco e Vanzetti

 

«Eles agora vão morrer e não resta nenhuma esperança.» De facto, Nicola Sacco e Bartolomeo Vanzetti, dois italianos que partiram para os Estados Unidos da América em busca de trabalho e melhores condições de vida, morreram na cadeira eléctrica, em 1927, sete anos depois do crime de que foram acusados.

«Enquanto houver vida há esperança – respondeu o comunista.» Nos EUA e por todo o mundo, desencadearam-se intensas campanhas de solidariedade. Em Outubro de 1921, O Comunista, órgão do PCP, dava notícia dos «protestos, moções, telegramas contra o iníquo assassinato» que caíam sobre os consulados americanos.

«Sei que aqueles homens estão inocentes, e contudo têm de morrer. A minha fé na decência humana morrerá com eles.» A forma como decorreu o julgamento pôs em causa o sistema de justiça. O juiz, o governo, a universidade, todos alinharam pelos mesmos preconceitos contra os trabalhadores, contra socialistas, comunistas e anarquistas, contra imigrantes. Forjaram-se testemunhos e provas de forma a encaixarem na história, ao mesmo tempo que se desvalorizaram os argumentos da defesa.

«– A sua fé morre facilmente – disse o comunista.» Artistas de todo o mundo sensibilizaram-se com o caso, tanto na altura, envolvendo-se na campanha pela libertação de Sacco e Vanzetti, como depois, lembrando a injustiça da sentença e o laço que liga o destino desses dois homens aos trabalhadores de todo o mundo. Por isso, ainda hoje as figuras de Sacco e Vanzetti aparecem em peças de teatro, filmes, séries de televisão, músicas, pinturas, jogos de computador, e em livros, muitos livros.

«– Acha? A sua fé é mais forte? Onde reside a sua fé, senhor?» «– Nos trabalhadores da América – respondeu o comunista.» Um desses artistas foi Howard Fast, que publicou dezenas de livros mas se destacou sobretudo pelo seu papel incontornável na divulgação do romance histórico. Vários dos seus livros tiveram adaptações para o cinema, dos quais sobressai Spartacus, realizado por Stanley Kubrick e com interpretações de Kirk Douglas e Laurence Olivier. Também aí, Howard Fast mostra a universalidade da luta dos trabalhadores, onde todos são Spartacus.

«– E os trabalhadores… onde estão?» «– Em toda a parte.» Howard Fast, à semelhança de outros militantes comunistas americanos, foi chamado a depor perante o Comité das Actividades Anti-Americanas, onde se recusou a fornecer nomes, sendo por isso condenado a três meses de prisão. Foi, aliás, nesse período na prisão que escreveu Spartacus. Dois anos depois publicaria este A Paixão de Sacco e Vanzetti, que as Edições «Avante!» lançam agora na colecção Biblioteca Avante!. Neste livro, onde os personagens – à excepção de Sacco e Vanzetti, os seus familiares e Celestino Medeiros (um emigrante português que confessou o crime e foi também executado) – não têm nome, o leitor acompanha o dia da execução, o ânimo dos condenados, o medo dos carrascos, a confiança dos que lutam.

«–Os comunistas?» «– Não, os comunistas não. Os trabalhadores. E aqueles que assassinam Sacco e Vanzetti odeiam os comunistas somente porque sabem que os comunistas estão ligados com os trabalhadores.»

(sublinhados meus)

AQUI

 

Luís Veiga Leitão: Manhã

Luis Veiga Leitao3

 

Manhã

Bom dia. Diz-me um guarda.

Eu não ouço...apenas olho

das chaves o grande molho

parindo um riso na farda.

 

Vómito insuportável de ironia

Bom dia, porquê bom dia?

 

Olhe, senhor guarda

(no fundo a minha boca rugia)

aqui é noite, ninguém mora,

deite esse bom dia lá fora

porque lá fora é que é dia!

Luís Veiga Leitão

 

José Gomes Ferreira: Todos os punhais

Jose Gomes Ferreira_caricatura

 
Desenho de Fernando Campos (o sítio dos desenhos)

 

Todos os punhais

Todos os punhais que fulgem nos gritos,

Todas as fomes que doem no pão

Todo o suor que luz nas estrelas

Todas as lanças nos dedos da reza,

Todos os soluços para ressuscitar os filhos mortos,

Todos os desejos nos alçapões do frio,

Todas as jóias nos pescoços dos espelhos rachados

Todos os assassinos que andaram aos colo das mães,

Todos os atestados de pobreza com lágrimas de carimbo,

Todos os murmúrios do sol no quarto ao lado à hora da morte…

 

Tudo, tudo, tudo

Se condensou de repente

Numa nuvem negra de milhões de lágrimas

A humilharem-me de ternura

– eu que quero ser alheio, duro, indiferente…

 

…. Enquanto os outros dançam, cantam, bebem,

vivem, amam, riem, suam

neste pobre planeta

magoado das pedras e dos homens

onde cresceu por acaso o meu coração no musgo

aberto para a consciência absurda

deste remorso sem sentido.

José Gomes Ferreira

 

31 de Outubro de 1902 – Nasce Drummond de Andrade

Carlos Drummond de Andrade

Nascido em Itabira do Mato Dentro, Minas Gerais, o consagrado poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade é justamente considerado como um dos principais representantes da literatura do Brasil do século XX.

Inicia os estudos em Belo Horizonte e aos 16 anos vai estudar com os jesuítas no Colégio Anchieta, em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro.

Apesar de bom aluno, é expulso por mau comportamento e «insubordinação mental», por discordar de um professor durante a aula.

Colabora no Diário de Minas, de que chega a ser Chefe de Redacção, e integra o movimento modernista em formação, que mais tarde o leva a conhecer os modernistas paulistas Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Blaise Cendrars.

O ingresso no serviço público como chefe de gabinete de Gustavo Capanema, ministro da Educação – cargo de que se demite em protesto contra a ditadura de Getúlio Vargas – não o afasta da escrita.

Data dessa época a obra «Rosa do Povo» (Uma flor nasceu na rua!/ Passem de longe, bondes, ónibus, rio de aço do tráfego./ Uma flor ainda desbotada/ ilude a polícia, rompe o asfalto...).

Empenhado política e socialmente, Drummond de Andrade afirma-se como o poeta mais influente da literatura brasileira do seu tempo, tendo também publicado diversos livros em prosa.

AQUI

 

9 de Outubro de 1967 – Assassinato de Che Guevara

 

O argentino-cubano Ernesto Guevara de la Serna, conhecido por «Che» Guevara, foi um dos comandantes da Revolução cubana, ao lado de Fidel e outros revolucionários, tendo assumido vários cargos na reorganização do Estado entre 1959 e 1965.

Com uma personalidade multifacetada – foi guerrilheiro, político, jornalista, escritor e médico – Che deixa Cuba para lutar por um mundo mais justo.

Chega à Bolívia em Março de 1967, com um grupo de guerrilheiros.

É cercado por militares bolivianos e capturado, ferido mas com vida, a 8 de Outubro.

Cumprindo ordens da CIA, o presidente da Bolívia, René Barrientos, autoriza a execução sumária de Che no dia seguinte e manda esconder o corpo, que só virá a ser encontrado 30 anos depois.

Os restos mortais foram trasladados para Cuba, onde é homenageado como herói nacional.

AQUI

 

15 de Junho de 1924 – 20 Poemas de Amor e uma Canção Desesperada

20-Poemas de Amor

Pablo Neruda, aliás Nefatali Ricardo Reyes, tinha apenas 20 quando editou o livro «20 Poemas de Amor uma Canção Desesperada», consensualmente considerado como uma jóia da poesia latino-americana.

Dirigidos por um homem a uma mulher – não necessariamente a mesma –, os poemas abordam a complexidade da relação amorosa, misturando a felicidade com a melancolia, a alegria da posse com a tristeza da ausência, a certeza do amor («Quero fazer contigo o que a primavera faz com as cerejeiras», poema 14), com o desespero do abandono («Posso escrever os versos mais tristes esta noite», poema 20).

Com propriedade, esta obra da juventude revela o poeta que Neruda tão bem definiu quando recebeu o Nobel de Literatura em 1971:

«Frequentemente disse que o melhor poeta é o homem que nos entrega o pão de cada dia, o padeiro mais próximo e que não se crê um deus. Ele cumpre a sua majestosa e humilde tarefa de amassar, colocar o pão no forno, dourar e entregar o pão de cada dia como uma obrigação comunitária. E se o poeta alcançar esta consciência poderá também converter-se como parte de uma colossal obra de artesão [...] e entregar com a sua mercadoria: pão, verdade, vinho e sonhos.»

AQUI

 

Pablo Neruda_Av

Pablo Neruda e Pablo Neruda

 

As cinco dificuldades para escrever a verdade (Recapitulação)

Bertolt_Brecht.jpg

(continuação)

Hoje, o escritor que deseje combater a mentira e a ignorância tem de lutar, pelo menos, contra cinco dificuldades. É-lhe necessária a coragem de dizer a verdade, numa altura em que por toda a parte se empenham em sufocá-la; a inteligência de a reconhecer, quando por toda a parte a ocultam; a arte de a tornar manejável como uma arma; o discernimento suficiente para escolher aqueles em cujas mãos ela se tornará eficaz; finalmente, precisa de ter habilidade para difundir entre eles. Estas dificuldades são grandes para os que escrevem sob o jugo do fascismo; aqueles que fugiram ou foram expulsos também sentem o peso delas; e até os que escrevem num regime de liberdades burguesas não estão livres da sua acção.

 

RECAPITULAÇÃO

 

A grande verdade da nossa época (só seu conhecimento em nada nos faz avançar, mas sem ela não se pode alcançar nenhuma outra verdade importante) é que o nosso continente se afunda na barbárie porque nele se mantêm pela violência determinadas relações de propriedade dos meios de produção. De que serve escrever frases corajosas mostrando que é bárbaro o estado de coisas em que nos afundamos (o que é verdade), se a razão de termos caído nesse estado não se descortina com clareza? É nossa obrigação dizer que, se se tortura, é para manter as relações de propriedade. Claro que ao dizermos isso perdemos muitos amigos; aqueles que são contra a tortura porque julgam ser possível manter sem ela as relações de propriedade (o que é falso).

Devemos dizer a verdade sobre as condições bárbaras que reinam no nosso país a fim de tornar possível a acção que as fará desaparecer, isto é, que transformará as relações de propriedade.

Devemos dizê-la aos que mais sofrem com as relações de propriedade e estão mais interessados na sua transformação, ou seja: aos operários e aos que podemos levar a aliarem-se com eles, por não serem proprietários dos meios de produção, embora associados aos lucros e benefícios da exploração de quem produz. E, é claro, devemos proceder com astúcia.

Devemos resolver em conjunto, e ao mesmo tempo, estas cinco dificuldades, já que não podemos procurar a verdade sobre condições bárbaras sem pensar nos que sofrem essas condições e estão dispostos a utilizar esse conhecimento. Além disso, temos de pensar em apresentar-lhes a verdade sob uma forma susceptível de se transformar numa arma nas suas mãos, e simultaneamente com a astúcia suficiente para que a operação não seja descoberta e impedida pelo inimigo.

São estas as virtudes exigidas ao escritor empenhado em dizer a verdade.

Bertolt Brecht_assinatura

Bertolt Brecht, Texto de 1934

Tradução de Ernesto Sampaio.
Publicado no Diário de Lisboa de 25/Abr/82

 

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