Fernão Mendes Pinto - «Peregrinação» "ministros da noite, que como cães..."
O projectado saque dos túmulos sagrados dos Imperadores da China não chega a ser consumado, embora António de Faria consiga profanar «os ossos dos santos» (LXXVI, 421). O conselho de Hiticou, o velho e santo eremita de Calempluy, a António de Faria, para que se arrependa antes que seja tarde demais é por ele acolhido com uma hipócrita promessa de se emendar, ao que o Hiticou responde, dizendo:
Queira Deus que seja isso assim, porque ao menos não terás castigo tão grande como essoutros ministros da noite, que como cães esfaimados me parece que toda a prata do mundo não os poderá fartar. (LXXVI, 421)
E assim é que o velho sacerdote budista faz soar a trombeta da perdição, que não tarda em chegar. Na viagem de regresso, António de Faria afunda-se com o seu navio, ao grito de «Senhor Deus, misericórdia!» ― um clamor que encontra eco em toda a Peregrinação.
In Rebecca CATZ, Fernão Mendes Pinto - sátira e anti-cruzada na Peregrinação
Ver o texto original de Fernão Mendes Pinto em Obra Completa (página 171)