Vinicius de Moraes - Era uma casa Muito engraçada Não tinha teto Não tinha nada Ninguém podia Entrar nela não Porque na casa Não tinha chão Ninguém podia Dormir na rede Porque na casa Não tinha parede Ninguém podia Fazer pipi Porque penico Não tinha ali Mas era feita Com muito esmero Na Rua dos Bobos Número Zero.
Ê, tem jangada no mar Ê, iê, iê Ê, hoje tem arrastão Ê, todo mundo pescar Chega de sombra, João J'ouviu
Olha o arrastão entrando no mar sem fim Ê, meu irmão, me traz Yemanjá prá mim
Minha Santa Bárbara, me abençoai Quero me casar com Janaína
Ê, puxa bem devagar Ê, iê, iê Ê, já vem vindo o arrastão Ê, é a Rainha do Mar Vem, vem na rede João Pra mim
Valha-me Deus, Nosso Senhor do Bonfim Nunca, jamais, se viu tanto peixe assim
Minha Santa Bárbara, me abençoai Quero me casar com Janaína
Ê, tem jangada no mar Ê, iê, iê Ê, hoje tem arrastão Ê, todo mundo pescar Chega de sombra, João J'ouviu
Olha o arrastão entrando no mar sem fim Ê, meu irmão, me traz Yemanjá prá mim Olha o arrastão entrando no mar sem fim Ê, meu irmão, me traz Yemanjá prá mim
Excerto de uma Minissérie de Gilberto Braga que retratou um período da ditadura militar no Brasil (1964 à 1979).
E, em 1965, numa época de efervescência política e cultural, surge Elis Regina no I Festival de Música Popular Brasileira. Sua interpretação de 'Arrastão' (Vinicius de Moraes e Edu Lobo) entrou para a história e não poderia ter ficado de fora da série.
Arrastãovence o I Festival de Música da TV Excelsior e Elis Reginaarrebata o prêmio de melhor cantora.
Se le vio, caminando entre fusiles, por una calle larga, salir al campo frío, aún con estrellas de la madrugada. Mataron a Federico cuando la luz asomaba. El pelotón de verdugos no osó mirarle la cara. Todos cerraron los ojos; rezaron: ¡ni Dios te salva! Muerto cayó Federico —sangre en la frente y plomo en las entrañas— ... Que fue en Granada el crimen sabed —¡pobre Granada!—, en su Granada.
2. El poeta y la muerte
Se le vio caminar solo con Ella, sin miedo a su guadaña. —Ya el sol en torre y torre, los martillos en yunque— yunque y yunque de las fraguas. Hablaba Federico, requebrando a la muerte. Ella escuchaba. «Porque ayer en mi verso, compañera, sonaba el golpe de tus secas palmas, y diste el hielo a mi cantar, y el filo a mi tragedia de tu hoz de plata, te cantaré la carne que no tienes, los ojos que te faltan, tus cabellos que el viento sacudía, los rojos labios donde te besaban... Hoy como ayer, gitana, muerte mía, qué bien contigo a solas, por estos aires de Granada, ¡mi Granada!»
3.
Se le vio caminar... Labrad, amigos, de piedra y sueño en el Alhambra, un túmulo al poeta, sobre una fuente donde llore el agua, y eternamente diga: el crimen fue en Granada, ¡en su Granada!
Outro poeta de grande nome no Brasil e no estrangeiro é Vinicius de Moraes, que apareceu na segunda geração do modernismo, a partir de 1930. A sua obra trouxe ao modernismo o sentido de equilíbrio entre o velho e o novo, restaurando formas como o soneto e a balada e, principalmente, dando ao verso tradicional uma nova linguagem e um ritmo novo aos versos livres, numa musicalidade que agradou bastante o leitor. Não é, portanto, por acaso, que Vinicius de Moraes veio a tornar-se um dos maiores compositores da música popular brasileira. No seu livro Nossa Senhora de los Ángeles e Nossa Senhora de Paris, escritos no fim da década de 1940 e publicado em Obra Poética (1968), dedica um poema à morte de García Lorca: "A Morte na Madrugada", com uma epígrafe tomada a Antonio Machado ("Muerto cayó Federico"). Este poema retoma também o sentido narrativo do Romancero Gitano, intertextualizando alguns de seus versos, como na primeira e na última estrofes:
Uma certa madrugada Eu por um caminho andava Não sei bem se estava bêbado Ou se tinha a morte n'alma Não sei também se o caminho Me perdia ou encaminhava.
Só sei que a sede queimava-me A boca desidratada. Era uma terra estrangeira Que me recordava algo Com sua argila cor de sangue E seu ar desesperado.
Lembro que havia uma estrela Morrendo no céu vazio De uma outra coisa me lembro: … um horizonte de perros ladra muy lejos del río… [ …]
Atiraram-lhe na cara Os vendilhões de sua pátria Nos seus olhos andaluzes Em sua boca de palavras. Muerto cayó Federico Sobre a terra de Granada La tierra del inocente No la tierra del culpable. Nos olhos que tinha abertos Numa infinita mirada Em meio a flores de sangue A expressão se conservava Como a segredar-me: — a morte É simples, de madrugada…
Percebe-se neste poema a força da influência da poesia de García Lorca, sobretudo a partir do Romancero Gitano, de 1928. Os poetas jovens do Brasil, vindos da dicção modernista, haviam abandonado a redondilha, talvez considerando-a demasiadamente popular. Lorca ajudou portanto a restaurar uma forma poética na literatura brasileira, a que tinha, aliás, como contraponto popular, o uso quase exclusivo dos versos de sete sílabas, como nos poetas de cordel, principalmente do Nordeste. Via-se que tal ritmo, tido como superado, estava sendo trabalhado por Lorca no sentido de juntar o popular ao erudito. Daí uma série de poemas em redondilhas, a partir de 1945, o que fez a crítica pensar numa volta aos movimentos literários anteriores ao modernismo. Chegou-se a falar num Neomodernismo — a geração de 45, de onde saíram João Cabral e Lêdo Ivo.
UMA CERTA madrugada Eu por um caminho andava Não sei bem se estava bêbedo Ou se tinha a morte n'alma Não sei também se o caminho Me perdia ou encaminhava Só sei que a sede queimava-me A boca desidratada. Era uma terra estrangeira Que me recordava algo Com sua argila cor de sangue E seu ar desesperado. Lembro que havia uma estrela Morrendo no céu vazio De uma outra coisa me lembro: ... Un horizonte de perros Ladra muy lejos del río...
De repente reconheço: Eram campos de Granada! Estava em terras de Espanha Em sua terra ensangüentada Por que estranha providência Não sei... não sabia nada... Só sei da nuvem de pó Caminhando sobre a estrada E um duro passo de marcha Que eu meu sentido avançava. Como uma mancha de sangue Abria-se a madrugada Enquanto a estrela morria Numa tremura de lágrima Sobre as colinas vermelhas Os galhos também choravam Aumentando a fria angústia Que de mim transverberava.
Era um grupo de soldados Que pela estrada marchava Trazendo fuzis ao ombro E impiedade na cara Entre eles andava um moço De face morena e cálida Cabelos soltos ao vento Camisa desabotoada. Diante de um velho muro O tenente gritou: Alto! E à frente conduz o moço De fisionomia pálida. Sem ser visto me aproximo Daquela cena macabra Ao tempo em que o pelotão Se punha horizontal.
Súbito um raio de sol Ao moço ilumina a face E eu à boca levo as mãos Para evitar que gritasse. Era ele, era Federico O poeta meu muito amado A um muro de pedra-seca Colado, como um fantasma. Chamei-o: Garcia Lorca! Mas já não ouvia nada O horror da morte imatura Sobre a expressão estampada... Mas que me via, me via Porque eu seus olhos havia Uma luz mal-disfarçada.
Com o peito de dor rompido Me quedei, paralisado Enquanto os soldados miram A cabeça delicada.
Assim vi a Federico Entre dois canos de arma A fitar-me estranhamente Como querendo falar-me Hoje sei que teve medo Diante do inesperado E foi maior seu martírio Do que a tortura da carne. Hoje sei que teve medo Mas sei que não foi covarde Pela curiosa maneira Com que de longe me olhava Como quem me diz: a morte É sempre desagradável Mas antes morrer ciente Do que viver enganado.
Atiraram-lhe na cara Os vendilhões de sua pátria Nos seus olhos andaluzes Em sua boca de palavras. Muerto cayó Federico Sobre a terra de Granada La tierra del inocente No la tierra del culpable. Nos olhos que tinha abertos Numa infinita mirada Em meio a flores de sangue A expressão se conservava Como a segredar-me: A morte É simples, de madrugada...